Avaliação de Impacto na Educação

No mundo moderno, assume destaque o investimento no ser humano. Tem-se, de um lado, a educação como um bem de consumo, na medida em que é desejada por si própria, ou considerada recompensadora e intelectualmente estimulante em si mesma. Por outro lado, a educação é claramente considerada um bem de capital ou investimento, na medida em que as pessoas que a adquirem deriva um fluxo futuro de benefícios. Entretanto, Blaug (1975) ressalta que o fato das conseqüências da educação, em termos de habilidades incorporadas às pessoas, ser considerado como capital humano não implica em dizer que as próprias pessoas estejam sendo tratadas como capital; em outras palavras, o capital humano é o valor atual das habilidades adquiridas pelas pessoas e não o valor das próprias pessoas.

Os investimentos em educação que permitem às pessoas a aquisição de conhecimentos e de capacidades que possuem valor econômico, combinados com outros investimentos em capital humano (saúde, por exemplo), explicam a grande superioridade produtiva, observada nos dias de hoje, dos países desenvolvidos sobre os demais (Schultz,1963 e 1967; Weisbrod, 1973).

A estimativa de taxas de retorno dos investimentos em educação é baseada na observação de que os níveis educacionais das pessoas estão associados positivamente aos seus rendimentos, e de que rendimentos mais elevados estão diretamente relacionados aos acréscimos educacionais que as pessoas recebem. Assim, pode-se visualizar melhor a superioridade produtiva das pessoas treinadas e, por conseguinte, dos países desenvolvidos, usando-se o conceito de função de produção. Se é tomado, por exemplo, o caso de dois indivíduos com a mesma idade, em que um deles (B) tem curso superior completo e o outro (A), apenas o nível primário obrigatório, espera-se que o melhor treinado obtenha maiores rendimentos, ou seja, situa-se em uma função de produção superior aquela do indivíduo menos treinado (Figura 1).

Deve-se salientar que, geralmente, os diferenciais absolutos de rendimento, entre níveis educacionais, aumentam com a idade. Sheehan (1975) observa, ainda, que os indivíduos com níveis educacionais mais elevados tenderão a alcançar rendimentos máximos em idades relativamente mais elevadas. O autor cita como exemplo o caso de trabalhadores manuais não-qualificados, que deixam a escola aos quinze anos de idade e que alcançam seus rendimentos máximos entre vinte e trinta anos de idade, enquanto que os médicos ou advogados, que permanecem na escola até a idade de vinte e dois e vinte e cinco anos, poderão alcançar rendimentos máximos com a idade de cinquenta anos ou mais.

Esses dois aspectos podem ser também visualizados na Figura 1, onde o diferencial de rendimentos aumenta entre A e B ao longo do tempo, e o rendimento máximo do indivíduo A (RAc) é atingido em tc., enquanto que, para o indivíduo treinado B, o rendimento máximo (RBd) ocorre no tempo td.

Um outro ponto importante a ser tratado é aquele referente à depreciação ou obsolescência do capital humano, o que, na prática, significa um decréscimo de rendimento do individuo, a partir de um determinado ponto no tempo. De fato, existem dois processos de obsolescência: o do capital humano intelectual e o do capital humano físico. Este trabalho se limita a considerar o primeiro.

A depreciação do capital humano intelectual tem duas dimensões: uma, absoluta e outra, relativa. A absoluta diz respeito à perda do conhecimento ou esquecimento, enquanto a depreciação relativa corresponde à estagnação ou pequeno progresso em relação a um mundo cientifico que se desenvolve de maneira acentuada. Nesse ú1timo caso, o indivíduo, em vez de encurtar o diferencial de conhecimento que existe entre o que ele sabe e a fronteira de conhecimento cientifico, deixa esse diferencial aumentar progressivamente.

A depreciação do capital humano é a responsável pela obtenção, pelos indivíduos, de rendimentos marginais decrescentes a partir de uma certa idade, conforme pode ser visto na Figura 1. Essa idade pode, entretanto, ser retardada graças a investimentos adicionais em educação. Através deles, não só se evita a depreciação do capital humano, mas faz-se com que os indivíduos envolvidos adquiram conhecimentos adicionais que lhes permitam obter, no futuro, rendimentos superiores aqueles sem tais treinamentos.

RETORNO DO INVESTIMENTO EM EDUCAÇÃO

A educação, tal como qualquer outra atividade econômica, usa certa proporção de recursos escassos, que poderiam ser investidos pelas pessoas e/ou pela sociedade em outras alternativas. Por exemplo, a despesa da sociedade em edifícios escolares significaria renunciar a edifícios residenciais e comerciais, ou então, a despesa com salários de professores representaria oportunidades de emprego perdidas em outro ramo da economia.

As estimativas dos retornos dos investimentos em educação podem ser feitas, do ponto de vista tanto privado, como social. Se forem comparados os custos e os benefícios da educação para os indivíduos, será obtida uma estimativa dos retornos privados. Por outro lado, se forem tomados os custos e os benefícios para a sociedade, a taxa de retorno social da educação pode ser estimada.

Na estimativa dos retornos privados, são considerados os custos de um incremento de educação e os benefícios derivados dessa educação suplementar, a nível de cada individuo. Os custos são medidos pelas despesas realizadas com anuidades, livros e outros itens,bem como pelos custos secundários ou indiretos correspondentes a renda sacrificada, uma vez que, para obter educação, um estudante talvez tenha de sacrificar oportunidades de trabalho remunerado, o que representa um custo real para ele. Os benefícios são medidos pela renda adicional que o estudante pode esperar obter durante o resto de sua vida, em relação ao que poderia esperar através de outra alternativa.

Os custos diretos da educação são facilmente calculáveis, pois incluem todos os gastos financeiros óbvios por parte do estudante. O mesmo não se pode dizer dos custos indiretos, os quais, por sua própria natureza, nem sempre estão sujeitos à mensuração monetária direta.

A partir do momento em que um individuo decide estudar, parte do tempo, anteriormente dedicado ao lazer ou ao trabalho, deveria ser dedicada à atividade educacional agora escolhida. Isso implica custo real para ele, uma vez que o lazer é presumivelmente algo desejável e, privar-se dele, envolve um custo. Da mesma forma, o trabalho é recompensado por salários e, se a educação significa perder trabalho, também significa sacrificar rendimentos. O valor do trabalho ou do lazer perdido é um custo indireto da educação e é chamado de “custo de oportunidade”. Naturalmente, esse custo é praticamente nulo quando a educação é compulsória, uma vez que o individuo não tem quase nenhum rendimento alternativo a sacrificar. Quando esse “custo de oportunidade” existe, é medido em termos dos rendimentos que o estudante deixa de receber em atividades adequadas à sua idade, treinamento e experiência.

Os benefícios privados são estimados em termos dos benefícios econômicos resultantes de um dado incremento de educação. De acordo com Sheehan (1975), esses benefícios, do ponto de vista de investimento, consistirão quase que inteiramente em rendimentos extras, derivados dessa educação suplementar, ou seja, em rendimentos adicionais àqueles que, de outra forma, o indivíduo receberia. O cálculo dos rendimentos privados adicionais se baseia nos diferenciais observados no passado, os quais podem ser quantificados através do uso de dados de corte seccional. Esses rendimentos, entretanto, devem corresponder à renda do indivíduo após a dedução dos impostos diretos.

Existem benefícios econômicos privados de menor importância, indiretamente resultantes de educação suplementar, tais como a maior variedade de escolha de empregos, o valor da opção de passar a outro nível educacional, ou ainda a menor probabilidade de desemprego. As taxas de retorno privadas da educação tem sido calculadas principalmente para o nível secundário e universitário, tanto nos países desenvolvidos como nos subdesenvolvidos. De um modo geral, as estimativas de taxas de retorno privado para a educação tem fornecido resultados bastante altos – 10% ou mais – em quase todos os casos. Essas taxas, comparadas com as taxas de juros em períodos normais, mostram-se superiores às taxas de retorno sobre os investimentos em capital físico nos respectivos países. Essa elevada rentabilidade da educação para o indivíduo é, em grande parte, um reflexo da forma como a educação é financiada, já que cabe ao Estado a maior parte de seus custos.

Por outro lado, no cálculo dos retornos sociais mede-se o benefício líquido, para a sociedade, de investimentos em educação. A forma de cálculo usada é geralmente semelhante aquela usada para o cálculo dos retornos privados. Ela deriva-se da taxa interna de retorno que torna o fluxo de benefícios sociais igual ao fluxo de custos sociais. A diferença reside naquilo que está incluído, no lado tanto dos benefícios, quanto dos custos. Enquanto nas estimativas dos retornos privados, os fluxos de rendimentos, que são tomados como medida dos benefícios diretos, excluem os impostos diretos, na estimativa dos retornos sociais esses fluxos incluem tais impostos. Já os custos diretos na estimativa dos retornos sociais incluem todos os gastos da sociedade, independente da fonte de financiamento. Isto significa que os custos privados constituem uma fração apenas dos custos sociais diretos, desde que a maior parte da educação é financiada com recursos públicos.

No calculo do fluxo de benefícios sociais líquidos devem ainda ser levados em consideração os custos sociais indiretos. Esses custos, que, em regra geral, correspondem a renda sacrificada durante o tempo dedicado à educação são medidos da mesma forma dos custos privados indiretos, acrescentando se os impostos. O “custo de oportunidade”, para a sociedade, seria então o valor dos rendimentos que os estudantes deixam de receber neste período. No entanto, existem diferenças teóricas entre alternativas sacrificadas na escala privada e na escala social. O investimento da sociedade em educação, por exemplo, poderá mudar a estrutura do mercado de trabalho para certos grupos de idade, alterando assim seus rendimentos e, conseqüentemente, os custos sociais indiretos.

A estimativa dos retornos sociais da educação, em razão de dificuldades de mensuração, não inclui os benefícios econômicos externos ou indiretos sob a forma de “spill-over”, ou seja, os benefícios que não revertem aos agentes econômicos que os geraram. Blaug (1975) classifica-os como “benefícios externos de primeiro grau”: tendência das pessoas melhor treinadas de elevarem os ganhos das pessoas menos treinadas que trabalham ao seu lado; e como “benefícios externos de segundo grau”: demanda reduzida de benefícios sociais, estímulos à educação e outros.

Este autor afirma que muitos economistas, independentemente do enfoque que tenham usado, tem omitido os benefícios externos na avaliação de impacto social, devido a grande dificuldade de quantificá-los. O autor ainda argumenta que os benefícios secundários, quando considerados sob o ponto de vista estritamente econômico dificilmente superariam os benefícios sociais diretos.

APLICABILIDADE DO CONCEITO

Dados os conceitos apresentados na seção anterior, e na hipótese de se fazer uma avaliação do impacto social da educação deveriam ser considerados critérios ou fatores que permitam avaliar os impactos em termos de melhorias no emprego, na saúde e nutrição, na redução dos desequilíbrios regionais, na minimização das desigualdades sociais e na redução de conflitos.

As melhorias no nível educacional das pessoas causa efeitos positivos os mais diversos, o que faz com que surjam oportunidades de emprego e/ou melhorias salariais, e conseqüentemente, elevação no nível de renda da família. Estas melhorias de renda provocam impactos positivos na saúde e nutrição dos membros da família, contribuem para redução das desigualdades quando os menos desfavorecidos são os beneficiários de programas de educação, reduzem as desigualdades quando atingem as classes mais pobres e minimizam os conflitos no campo quando os beneficiários são pequenos produtores e trabalhadores rurais.

Entretanto, neste trabalho, não se avançou no desenvolvimento de uma proposta de avaliação do impacto da educação, mas buscou-se identificar critérios de avaliação de um programa de marketing ligado à educação. Como afirma Kotler & Roberto (1992), todo o programa de marketing produz mudanças e conseqüências desintencionais ou efeitos colaterais dos efeitos intencionais. Tais efeitos são também classificados em efeitos de primeira ordem e de ordem superior. Blaug (1971) chama estes efeitos colaterais como benefícios externos ou secundários de primeiro e segundo graus.

No caso da avaliação de impacto de um programa de marketing, deve-se verificar se e como foram gerados resultados observáveis, ou seja, verificar o que aconteceu depois da implantação do programa e medir seus impactos do ponto de vista da sociedade. Dentre os critérios que podem ser observados para avaliar um programa de marketing, Kotler & Roberto (1992), citam os seguintes: desempenho, eficiência, eficácia, importância e valor. Tais critérios são definidos a seguir:

Desempenho

Na avaliação de desempenho deve-se verificar se os beneficiários do programa realmente receberam o produto social previsto.

Eficiência

No caso da eficiência se compara o desempenho do programa em termos dos seus benefícios e custos. Espera-se que os benefícios superem os custos. Também através deste critério verifica-se se os resultado refletem um uma utilização eficiente dos recursos disponíveis.

Eficácia

No caso da avaliação de eficácia compara-se o desempenho do programa com os objetivos e metas estabelecidos. Também é analisado se os beneficiários realmente receberam um produto social.

Importância

O programa deve demonstrar se seus resultados ou efeitos almejados foram realmente importantes para a sociedade.

Valor

A avaliação de valor tem a ver com a determinação do valor do programa de marketing. Os resultados devem demonstrar que tal programa teve realmente valor para sociedade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A importância de se realizar estudos de avaliação é por demais discutida e debatida na literatura. São vários os estudos desenvolvidos evidenciando os benefícios advindos das melhorias da educação. Por outro lado, também tem sido muito exploradas as avaliações de impacto de programas nas áreas de marketing, comunicação, etc.

Neste trabalho procurou-se destacar os principais aspectos teóricos que envolvem a avaliação econômica e social dos impactos da educação. É sabido que as melhorias educacionais causam efeitos substanciais na renda das famílias beneficiárias e consequentemente, minimizam uma série de problemas sociais quando os beneficiários desta melhoria são os mais pobres, seja no campo, seja na cidade.

Por outro lado, quando se trata da avaliação de um programa de marketing social, o exercício realizado mostrou que uma série de fatores devem ser considerados. Foram descritos os indicadores mais usados em tal tipo de avanço, que segundo Kotler & Roberto (1992), são os seguintes: desempenho, eficiência, eficácia, importância e valor.

Através da aplicação destes critérios, pode-se verificar se e como foram gerados resultados observáveis, ou seja, verificar o que aconteceu depois da implantação de um programa de marketing e medir seus impactos do ponto de vista da sociedade.

Bibliografia

BECKER, G.S.. Human Capital. New York, Columbia University Press, 1964.

BLAUG, M.. Introdução à Economia da Educação, Porto Alegre. Editora Globo. 1975.

KOTLER, P. & ROBERTO, E.L. Marketing Social: Estratégias para Alterar a Comportamento Público. Brasília, Editora Campus, 1992.

SCHULTZ, T.W.. The Economic Value of Education. New York, Columbia University Press, 1963.

SCHULTZ, T.W.. The rate of return in allocating investment resources education. The Journal of Human Resources, 2(3)-293-09, summer, 1967

SHEEHAN, J A Economia da Educação Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1975.

WEISBROD, B.A.. Investing in human capital. In: JOHNSON, H. G.& WEISBROD, B.A. eds. Englewood Cliffs, N.J., Prentice Hall,1973, p.146-60.

Sobre os atores:

Maria Célia Botelho Ulhôa Avila, Técnica em assuntos educacionais, Assessoria de Comunicação Social do Ministério de Educação
e
Antonio Flavio Dias Avila, Coordenador de Acompanhamento e Avaliação, da Secretaria de Administração Estratégica (SEA), da Embrapa